04 de outubro de 2015
Quase
nove anos depois do "rebaixamento", Plutão volta a ser centro das
atenções de astrônomos e curiosos. Em 2006, no mesmo ano que perdia sua
condição de planeta, uma sonda (com sugestivo nome de New Horizons) foi
enviada para estudá-lo e com sua chegada, em julho de 2015, o debate
sobre o que ele é de fato não só reacendeu, mas trouxe novos
conhecimentos a cerca desse gélido mundo.
DESCOBERTA, EVOLUÇÃO NO ESTUDO E "REBAIXAMENTO"
Em
1846, Netuno havia sido observado intencionalmente pela primeira vez.
Após extensos cálculos que mediam oscilações da órbita de Urano, os
astrônomos deduziram que algo o perturbava: um planeta. Netuno foi
previsto e localizado através da matemática. Mas nem tudo estava em
ordem, Urano ainda sentia influência de algo estranho e, para complicar,
Netuno também apresentava discrepâncias da sua órbita já calculada.
Já
em 1909, Percival Lowell e William Pickering iniciaram uma verdadeira
caçada atrás do que chamaram de Planeta X, porém depois de muitas
observações e várias fotografias do céu, nada foi encontrado e o projeto
foi abandonado. Lowell morreu em 1916, sem saber que ainda fotografou
Plutão duas vezes, mas não o reconheceu dentre as estrelas distantes.
Clyde
Tombaugh, astrônomo norte-americano, chega ao Observatório Lowell em
1929 para reiniciar a busca pelo Planeta X. Em 18 de fevereiro de 1930,
em posse de três fotos tiradas no mês de janeiro nos dias 21, 23 e 29,
Tombaugh reconhece um objeto em movimento e após sucessivas observações
do local e a confirmação do Observatório de Havard, a notícia é
destaque: novo planeta é descoberto.
Clyde Tombaugh (1906 - 1997) |
O
nome Plutão foi dado por uma garotinha de 11 anos, Venetia Burney, que
adorava mitologia clássica e astronomia. Ela imaginou que o novo planeta
seria um local escuro e frio, assim como a moradia de Plutão, deus
romano do submundo e dos mortos. Através de uma conversa com seu avô que
tinha contato com professores influentes o nome chegou a público para
disputar com outras sugestões.
Em
24 de março de 1930, o nome Plutão estava oficializado e a garotinha
recebeu 5 libras como recompensa. Embora pareça mentira, o personagem da
Disney, o cachorro Pluto é uma homenagem ao novo membro do Sistema
Solar, assim como o elemento químico Plutônio, que na tabela periódica
sucedia ao elemento Netúnio.
Nos
anos seguintes à descoberta, os astrônomos ainda não estavam
convencidos que Plutão era causador das perturbações de Urano, pois sua
pequena massa seria capaz de provocar tais efeitos. Novas buscas ao
Planeta X começaram, no entanto todas fracassaram. Décadas depois, com a
visita da sonda Voyager 2 a Netuno, sua massa foi revisada e seus
efeitos gravitacionais em Urano foram explicados. A busca ao Planeta X
acabou.
Tudo
ia bem ao novo planeta e com seus satélites naturais sendo descobertos,
Caronte em 1978, Nix e Hidra em 2005. Mas com o passar dos anos novos
corpos foram descobertos no Sistema Solar: Quaoar em 2000 e Sedna em
2004. Localizados numa região chamada de Cinturão de Kuiper e com
tamanhos semelhantes ao de Plutão, também morador do Cinturão, sua
classificação como planeta começou a ser questionada.
O
copo da discussão transbordou quando foi anunciado a descoberta de Éris
em 2005. Maior que Plutão, chegou a ser anunciado como décimo planeta,
mas astrônomos de todo o mundo acharam que era hora de definir critérios
para classificar os objetos. Nesse momento cogitou-se inclusive que
Plutão seria um asteroide.
Em 2006, a União Astronômica Internacional criou a definição formal para planeta. O objeto terá que obedecer três condições:
- Estar em órbita ao redor do Sol;
- Ser esférico por sua própria gravidade,ou seja, ter equilíbrio hidrostático;
- Ser gravitacionalmente dominante.
Plutão
não obedece ao terceiro critério e uma nova categoria de objetos foi
criada: os Planetas-anões. Nesta nova classe foram colocados, além do
nosso personagem principal, Éris, Ceres (ex-asteroide), Quaoar e Sedna.
Como no futebol, esse rebaixamento foi alvo de críticas, troca de
ofensas e até ações criminais surgiram diante da novidade, mas até o
presente texto ser escrito, Plutão ainda permanecia na "segunda divisão"
do Sistema Solar.
New Horizons
Em
19 de janeiro de 2006, uma sonda lançada para estudar o então nono
planeta, seus satélites e demais membros do Cinturão de Kuiper, trouxe o
atual ex-planeta de volta aos holofotes. Depois de 9 meses e meio de
viagem, New Horizons, carregando parte das cinzas da cremação de seu
descobridor, sobrevoou a superfície de Plutão em 14 de julho de 2015 e
além de novidades científicas sobre ele, trouxe de volta a discussão
sobre sua reclassificação. A seguir veremos um pouco sobre esse pequeno,
mas tão discutido astro do nosso Sistema Solar.
ORIGEM E CARACTERÍSTICAS
A
origem de Plutão é intrigante. Foi sugerida que fosse um satélite de
Netuno que escapuliu ou mesmo expulso por Tritão, maior satélite
netuniano. O fato de Plutão ter características cometárias enfraqueceu
esta hipótese. Na teoria mais aceita, ele seria um planetesimal (planeta
em formação) residual que não completou seu desenvolvimento. Durante a
formação e estabilização do Sistema Solar, Netuno teria sido empurrado
por forças vindas da interação Júpiter-Saturno, esse empurrão modificou a
posição do Cinturão de Kuiper e causou ressonância em seus membros
(cometas em sua maioria), alterando deles e trazendo Plutão mais para
próximo do Sol em relação aos demais.
Plutão
leva cerca de 248 anos para completar uma volta ao redor do Sol, sua
órbita é inclinada cerca de 17° em relação a ecliptica e forma uma
elipse bem excêntrica, onde no seu afélio fica a cerca de 7,37 bilhões
de quilômetros do Sol e no periélio a menos 4,44 bilhões da estrela,
ficando mais próximo que Netuno, mas devido à ressonância as órbitas
eles nunca colidirão. Sua rotação leva cerca de 6 dias e 9 horas
terrestres e seu eixo é inclinado 120° ao plano da órbita, ou seja, ele
gira praticamente de lado.
Órbitas de Plutão e Netuno "vistas de cima" |
Plutão tem magnitude aparente
de 15,1 o que o torna impossível de vê-lo inclusive com telescópios
amadores de médio porte. Seu diâmetro mede cerca de 2.370 km, ante os
12.800 km da Terra e os 3.474,8 km da nossa Lua. Sua massa também é
pequena se comparada ao nosso planeta, menos que 0,24% da massa
terrestre. Como consequência da baixa massa, sua aceleração da gravidade
é pífia: 0,658 m/s². Para ilustrar: se desprezarmos a resistência da
atmosfera e jogarmos uma bola para o alto aqui na Terra com uma força a
ponto dela subir 10 metros, se fizermos a mesma experiência em Plutão
com a mesma força ela subiria cerca de 148 metros.
Comparação Terra, Lua, Plutão e Caronte |
Após a visita da sonda New Horizons detalhes sobre o solo e os acidentes geográficos plutonianos puderam ser observados.
Imagem do solo plutoniano captada pela New Horizons |
O
revelo de Plutão ainda é pouco conhecido. Com a chegada da New
Horizons, mais detalhes serão revelados, no entanto pelas imagens que já
foram estudadas, percebe-se uma região única e estranha. Uma das
descobertas mais relevantes é a ausência de crateras, indicando uma
superfície jovem. Os cientistas tem chamados certas regiões do planeta
de snakeskin, pele de cobra em inglês, por ter semelhança com as escamas
que formam a pele desses répteis. Também já foram observadas cadeias de
montanhas de gelo com mais de 3 mil metros de altura e planícies com
aspecto intrigante, cortada por valas, como na fotografia abaixo.
Plutão
dispõe de uma tênue atmosfera composta praticamente nitrogênio (90%) e
metano (10%). Sua pressão atmosférica é quase nula, alcançando 0,01 kPa
(a pressão terrestre a nível do mar é cerca de 101 kPa). Devido a grande
variação entre seu afélio e periélio, a atmosfera plutoniana congela a
medida que o planeta se distancia do Sol e lentamente cai em sua
superfície. Alguns anos depois, quando o planeta avança em sua órbita se
aproximando da estrela, os gases congelados na superfície se sublimam
retornando à atmosfera.
Nesta imagem, vê-se a fina atmosfera de Plutão |
SATÉLITES DE PLUTÃO
Apesar
de pequeno, Plutão tem 5 satélites naturais conhecidos até o momento:
Caronte, Nix, Hidra, Cérbero e Estige. Caronte, descoberto em 1978, é o
maior de todos. Trata-se do maior satélite do sistema solar em
comparação com seu planeta. Tem cerca de 1.200 km de diâmetro e está a
apenas 19.640 km do planeta, tal fato gera uma situação inusitada: O
centro de massa do sistema Plutão-Caronte é externo ao planeta, ou seja,
a dupla gira em torno de um ponto vazio no espaço, como se unida por
uma haste que girasse em torno de um ponto dessa haste mais próximo de
Plutão, devido sua maior massa. E mais: como consequência dessa "prisão"
gravitacional, mantêm sempre a mesma face de um para o outro.
Caronte |
Em
2005, mais dois satélites foram descobertos: Nix e Hidra, orbitando a
cerca de 48.700 km e 64.800 km, respectivamente, do baricentro do
sistema Plutão-Caronte. Devido à enorme distância e fraquíssimo brilho,
suas medidas do diâmetro são apenas estimativas: entre 36 a 42 km para
Nix e 40 a 55 km para Hidra.
Nix e Hidra têm formatos irregulares |
Por
fim, em 2011 e 2012, os dois últimos satélites naturais foram
descobertos, Cérbero e Estige, respectivamente. Cérbero tem uma órbita
circular e equatorial, orbita a cerca de 59.000 km do planeta, entre as
órbitas de Nix e Hidra, completando uma volta a cada 31 dias. Seu
tamanho reduzido (tem entre 13 a 34 km de diâmetro) impediu que fosse
descoberto junto com Nix e Hidra. Estige, o mais novo satélite
descoberto, ainda é menor que Cérbero, seu diâmetro é estimado entre 10 a
25 km. Seu período é de cerca de 20 dias terrestres e orbita a cerca de
42.000 km de Plutão.
Plutão e seus 5 satélites. P4 e P5 são Cérbero e Estige, respectivamente. |
FUTURO
Não
existem, no momento, outros projetos ou missões programadas para
Plutão. A sonda New Horizons ainda o estudará e enviará mais informações
por mais algum tempo, mas já está se afastando. Em breve, ela estará se
encontrando com outro membro do Cinturão de Kuiper até deixar o Sistema
Solar. Logo, ainda podemos esperar mais novidades desse discreto, mas
impressionante membro da família solar.
Plutão a 776.000 km de distância |
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