Constelações I: desenhos no céu

07 de abril de 2015



Quem nunca ficou a admirar o céu noturno, a ver as estrelas e construir desenhos, representações do dia a dia, da ficção ou mesmo figuras irreais. As estrelas, cada vez mais invisíveis devido à iluminação artificial e poluição, provocaram a curiosidade no ser humano desde que começou a apresentar sinais de inteligência.
Em diversos locais e épocas, aqueles pontinhos luminosos no céu pareciam formar imagens (talvez mensagens dos deuses) que ajudavam a identificar as estações do ano e outros eventos naturais cíclicos. Vamos fazer uma breve viagem no tempo e conhecer como algumas civilizações interpretavam e construíam suas figuras, até chegarmos à visão científica moderna.

HISTÓRIA

A Idade do Bronze média (cerca de 2.000 a. C.) guarda o mais antigo catálogo estelar. De origem suméria, sugere-se que tem por base catálogos mais antigos, mas sem comprovação. O zodíaco clássico teve origem no sistema no antigo sistema babilônico, o qual sofrera uma revisão pelos povos neobabilônicos.

Os chineses antigos (século V a. C.) dividiam o céu em recintos com 28 asterismos (outro nome para constelações). Apesar dos contatos com os povos do ocidente, os chineses mantiveram até meados do século XVIII sua própria forma de agrupar as estrelas. Entre suas constelações destacamos: Guardas Imperiais, Coração, Porta Ocidental, Porta Oriental, Sete Excelências e a Língua Enrolada.

Guardas Imperiais
Língua enrolada

Na América do Sul, os Tupis-Guaranis reconheciam a Via Láctea e a chamavam de Caminho da Anta, Tapi’i rapé, em guarani. Dentre as constelações indígenas brasileiras, o destaque é para a Ema, formada por estrelas das constelações ocidentais da Mosca, Lobo, Cruzeiro do Sul, Escorpião, Centauro e Compasso. A grande ave surge ao anoitecer da segunda quinzena de junho. Merece ênfase, também, a constelação do Homem Velho, cuja figura lembra um homem carregando um bastão. Ela surge no anoitecer da segunda quinzena de dezembro, marcando o período das chuvas para os índios do norte do Brasil. É formada pelas constelações ocidentais de Órion e Touro.

Ema

Homem Velho

Por curiosidade, observe agora as mesmas estrelas do Homem Velho, mas vistas conforme a divisão  ocidental moderna das constelações.

Órion e Touro

Os gregos antigos tiveram como base o catálogo estelar babilônico, este, em mãos helênicas, sofreu atualizações, porém a maioria de cunho mitológico, tais como Andrômeda, Baleia, Órion, Cassiopeia, tendo em vista que em muitas narrativas gregas os heróis são transformados em constelações.

Cláudio Ptolomeu (século II d. C.), com base em tabelas gregas, catalogou e relacionou 48 constelações, publicando seu resultado no 7º e 8º livros do Almagesto, sua maior obra. Este é a base da atual classificação ocidental dos agrupamentos de estrelas.

Porém boa parte do céu ainda era desconhecida, até que a partir do século XV, com o início das grandes navegações e exploração novas terras e rotas, a parte meridional celeste foi sendo catalogada e incorporada aos registros referentes ao hemisfério norte. Navegadores como Pieter Dirkszoon Keyzer e Frederick de Houtman, no fim do século XVI, foram responsáveis por definir constelações nessa região, ainda temos a participação de Nicolas Louis de Lacaille, preenchendo as “lacunas” que ainda restavam entre os asterismos. 


VISÃO MODERNA

O conceito popular de constelação é um agrupamento de estrelas que formam figuras como animais ou objetos, porém sabemos que estrelas aparentam estar próximas no céu, com raras exceções, estão de fato separadas por muitas centenas ou milhares trilhões de quilômetros, como vemos abaixo.

Estrelas distantes parecem vizinhas sob nossa visão

A União Astronômica Internacional - UAI definiu constelação (ou asterismo) assim: é a divisão da esfera celeste, geometricamente, em 88 regiões ou partes. Portanto, constelação não é mais só estrelas, mas uma região do céu, logo se uma estrela que não faça parte de nenhuma figura, mas que esteja na região de um dado asterismo, ela fará parte dele. Abaixo, por exemplo, temos Órion, tudo que estiver na linha pontilhada amarela pertence a constelação.

Órion e suas delimitações

Atualmente as constelações diminuíram sua importância no que se refere a estudos científicos, porém têm utilidade na localização dos astros no céu como na figura seguinte temos o esquema, onde mostra Vênus na constelação de Touro, próximo de Aldebarã (α de Touro).


A UAI reconhece 88 constelações, divididas em boreais, austrais, equatoriais e zodiacais, conforme localização na esfera celeste, um destaque para estas últimas, pois elas mantêm a classificação à parte pelo fato de serem por elas o caminho aparente percorrido pelo Sol, Lua e planetas no céu terrestre. A seguir apresentamos todos os asterismos conforme localização, com seus nomes em latim conforme determina a UAI visando padronizar a comunicação entre pessoas de diversos idiomas (assim também ocorre com os nomes científicos dos seres vivos), ao lado colocamos a abreviação latina usada para identificar estrelas e o nome em português.

Hemisfério norte ou boreal
Nome oficial (com abreviação)
Nome em português
Andromeda (And)
Andrômeda
Auriga (Aur)
Cocheiro
Boötes (Boo)
Boieiro
Camelopardalis (Cam)
Girafa
CanesVenatici(CVn)
Cães de Caça
Canis Minor (CMi)
Cão Menor
Cassiopeia (Cas)
Cassiopeia
Cepheus (Cep)
Cefeu
Coma Berenices (Com)
Cabeleira de Berenice
Corona Borealis(CrB)
Coroa Boreal
Cygnus (Cyg)
Cisne
Delphinus (Del)
Delfim
Draco (Dra)
Dragão
Equuleus (Equ)
Potro
Hercules (Her)
Hércules
Lacerta (Lac)
Lagartixa
Leo Minor(LMi)
Leão Menor
Lynx (Lyn)
Lince
Lyra (Lyr)
Lira
Pegasus (Peg)
Pégaso
Perseus (Per)
Perseu
Sagitta (Sge)
Flecha
Triangulum (Tri)
Triângulo
Ursa Major (UMa)
Ursa Maior
Ursa Minor(UMi)
Ursa Menor
Vulpecula (Vul)
Raposinho


Hemisfério sul ou austral
Nome oficial (com abreviação)
Nome em português
Antlia (Ant)
Máquina Pneumática
Apus (Aps)
Ave-do-Paraíso
Ara (Ara)
Altar
Caelum (Cae)
Cinzel
Canis Major (CMa)
Cão Maior
Carina (Car)
Quilha
Centaurus (Cen)
Centauro
Chamaeleon (Cha)
Camaleão
Circinus (Cir)
Compasso
Columba(Col)
Pomba
Corona Australis (CrA)
Coroa Austral
Crux  (Cru)
Cruzeiro do Sul
Dorado (Dor)
Dourado
Eridanus (Eri)
Erídano (Rio)
Fornax (For)
Fornalha
Grus (Gru)
Grou
Horologium (Hor)
Relógio
Hydrus(Hyi)
Hidra macha
Indus (Ind)
Índio
Lepus (Lep)
Lebre
Lupus (Lup)
Lobo
Mensa (Men)
Mesa
Microscopium (Mic)
Microscópio
Musca (Mus)
Mosca
Norma (Nor)
Régua
Octans (Oct)
Oitante
Pavo (Pav)
Pavão
Phoenix (Phe)
Fênix
Pictor (Pic)
Cavalete do Pintor
PiscisAustrinus (PsA)
Peixe Austral
Puppis (Pup)
Popa
Pyxis (Pyx)
Bússola
Reticulum (Ret)
Retículo
Sculptor (Scl)
Escultor
Scutum (Sct)
Escudo
Telescopium (Tel)
Telescópio
TriangulumAustrale(TrA)
Triângulo Austral
Tucana (Tuc)
Tucano
Vela (Vel)
Vela
Volans (Vol)
Peixe-Voador


Região equatorial

Nome oficial (com abreviação)
Nome em português
Aquila (Aql)
Águia
Cetus (Cet)
Baleia
Corvus (Crv)
Corvo
Crater (Crt)
Taça
Hydra (Hya)
Hidra
Monoceros (Mon)
Unicórnio
Orion (Ori)
Órion
Serpens (Ser)
Serpente
Sextans (Sex)
Sextante

Região zodiacal

Nome oficial (com abreviação)
Nome em português
Aquarius (Aqr)
Aquário
Aries (Ari)
Carneiro
Cancer (Cnc)
Caranguejo
Capricornus (Cap)
Capricórnio
Gemini (Gem)
Gêmeos
Leo (Leo)
Leão
Libra (Lib)
Balança
Ophiuchus (Oph)
Serpentário
Pisces (Psc)
Peixes
Sagittarius (Sgr)
Sagitário
Scorpius (Sco)
Escorpião
Taurus (Tau)
Touro
Virgo (Vir)
Virgem
Conhecemos algumas estrelas por seus nomes populares como Aldebarã, Estrela Polar, Vega, mas, a fim de uniformizar a comunicação e a literatura astronômica, as estrelas recebem nomes especiais (um pouco sem graça) e são identificadas por letras do alfabeto grego: α (alfa), β (beta), γ (gama) etc. seguida da abreviatura nome da constelação em latim ou ainda do genitivo (uma redução do radical da palavra latina), vejamos exemplos.

Aldebarã – α Tau (ou α tauri)

Pólux – β Gem (ou β geminorum)

Em geral, as letras gregas referem-se ao brilho aparente das estrelas, α a mais brilhante, β a segunda e assim sucessivamente, mas em algumas constelações isso não é regra. Em Órion, por exemplo, a estrela α Ori é Betelgeuse cuja magnitude aparente é 0,45, enquanto Rigel (β Ori) tem intensidade luminosa de 0,15. Não esqueça! Quando se refere a magnitude luminosa, quanto menor valor numérico, mais brilhante é o astro.


DICAS PARA AUXILIAR A LOCALIZAÇÃO DE CONSTELAÇÕES

Localizar constelações pode ser um bom passatempo, mas lembre-se é necessário ter (muita) paciência, além de condições boas de observação, como estar afastado de ambientes muito luminosos, tais como núcleos urbanos e postes, noites de luar também interferem, pois a Lua faz o céu ficar claro demais, encobrindo estrelas mais fracas. Também se faz necessário ter um mapa do céu ou cartas celestes, pois como encontrar algo que não se conhece? Ter bom senso ajuda, pois não vá imaginando encontrar figuras idênticas às imagens que representa (você jamais verá um peixe observando a constelação de Peixes), pois são apenas representações grosseiras, às vezes nem isso, Cão Menor que o diga.

Vamos exemplificar! Tentemos encontrar Escorpião, a qual se parece muito com um escorpião de verdade. A partir do anoitecer da segunda metade de junho, ela já está completa no céu. Seu desenho é o seguinte:

Escorpião em um mapa celeste

Com base na informação: “A partir do anoitecer da segunda metade de junho, ela já está completa no céu.” Você volta-se para o leste e vê:



Sempre busque informações, sua estrela mais brilhante, Antares, tem tonalidade vermelha e está próxima da estrela central de três que estão aproximadamente alinhadas no sentido Norte-Sul. Antares é também a referência para o restante, pois o corpo do escorpião segue levemente para o sul (olhe constantemente para seu mapa) e a ponta da cauda (o ferrão) curva-se para norte, então:

Escorpião ao centro de "frente" para Libra

Sempre busque referências: estrelas mais luminosas, duplas ou trios estelares, formas geométricas também auxiliam bastante, pois são fáceis de comparar com as cartas celestes, vejamos o exemplo do Cão Maior. Esta constelação já está pouco acima do horizonte, à leste, ao pôr-do-Sol da última semana do ano. Nela temos três estrelas bem luminosas: Aludra (η CMa), Adhara (ε CMa) e Wezen (δ CMa) formando um triângulo, com Wezen “apontando” para norte, além disso é nessa constelação que encontramos a estrela mais brilhante do céu, Sírius (α CMa).



Bem, demos um pontapé inicial para instigar a “caça às constelações”, são 88 objetivos a atingir, uns mais fáceis outros quase impossíveis, mas cabe tentar. Se interessar, continue explorando esse tema, com enfoque num grupo seleto e envolvido de misticismo, o zodíaco, bem como um pouco da história das demais constelações.

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